Muito se tem discutido a respeito da educação remota que se impôs no Brasil com a pandemia Covid-19, que levou a determinação de suspensão das atividades educacionais presenciais por parte do Poder Público.
De um lado vemos pais querendo redução das mensalidades escolares já que o contrato firmado para o ano de 2020 não está sendo cumprido, de outro escolas afirmando ser impossível a redução pela alteração do contrato ter se dado por fato alheio à vontade destas que também se encontram prejudicadas, pais afirmando ter havido redução de custos para as escolas o que possibilitaria os desconto pleiteado, gestores afirmando que o investimento para adaptação com plataformas EAD, estrutura para gravação, suporte de TI, foi muito alto e não há possibilidade de reduzir os valores pactuados.
Quem está com a razão? Ambos os lados, a partir do ponto de vista de cada um, realmente não houve alteração do sistema de ensino por vontade das instituições, não há culpa nem dos pais nem dos gestores, somos todos igualmente vítimas de um momento ímpar na história mundial que obriga a reinvenção em diversos setores, sendo o educacional apenas um deles.
Em pouco tempo diversos projetos de lei para redução, desconto, das mensalidades escolares enquanto perdure a pandemia proliferaram no Congresso Nacional, mas até a presente data não há uma definição nesse sentido, as Assembleias Legislativas dos estados também se movimentaram e no país temos alguns estados já com leis nesse sentido.
Em Mato Grosso, a Deputada Janaína Riva propôs 30% de desconto nas mensalidades, mas o que foi aprovado foi a redução de 5% nas mesmas e a possibilidade de isoladamente os interessados pleitearem junto às instituições de ensino descontos de até 30%, mediante comprovação de dificuldades de pagamento da mensalidade no valor contratado frente a situação econômica agravada pela crise econômica decorrente da pandêmica, e o eventual desconto deverá ser futuramente pago em parcelas sucessivas, ou seja, não é uma redução automática mas condicionada à requerimento que pode ser ou não deferido pela escola, e o que haverá será uma postergação do pagamento do percentual concedido para quando do retorno das atividades presenciais. Vemos que a melhor saída é os pais se mobilizarem para juntos tentarem suas negociações de desconto nas instituições de ensino, e antes de buscarem a solução judicial apostarem no diálogo e na negociação.
Contudo, acreditamos que a situação mais preocupante, em que pese a relevância do aspecto financeiro, é a qualidade das aulas que estão sendo propiciadas. As escolas têm adotado sistemáticas diversas, umas encaminhando vídeo aulas e atividades, outras ministrando aulas on line via aplicativos, escolas públicas com aulas via TV e apostilas para que os alunos estudem em casa. Certo é que ninguém estava preparado para um homeschooling imposto e apenas podemos buscar o sistema de aulas a distância que cause menos prejuízo e a necessidade de considerar que na educação infantil e fundamental (séries iniciais) não deve utilizar a mesma didática do ensino fundamental nas séries finais, e também que para o Ensino Médio e Superior é possível uma adequação metodológica para que se propicie ao máximo os conteúdos que seriam dados nas aulas presenciais. Ou seja, não há como as escolas que atendam da educação infantil ao ensino médio adotarem uma estratégia única para todos, sob pena de prejuízos educacionais inegáveis.
Para nós, o grande objetivo é estabelecer um elo entre a rotina pré-pandemia e a nova realidade que se reconfigura diariamente – e que exige respostas rápidas e muita flexibilidade de todos os lados.
Posto isso, as recentes mudanças evidenciam ainda mais a importância da comunicação como ponto estratégico nas instituições e na vida das pessoas, na atualização de notícias, informações em saúde, logística da vida diária, funcionamento de estabelecimentos, serviços públicos e, fundamentalmente, na rotina escolar. Não é hora de achar culpados, mas soluções, e essencialmente a relação escola-família deve ser de total parceria neste momento e isso começa por uma comunicação assertiva e um canal aberto de diálogo para ajustes essenciais.
A frequência da comunicação fortalece os vínculos da relação escola-família, e os canais de comunicação precisam funcionar tanto na frequência, como nas respostas e esclarecimentos, é preciso manter uma rotina diária de comunicação que busque ir além das demandas pedagógicas. Entendemos que essa comunicação deve ser segmentada por turmas, já que as dúvidas e preocupações de pais com filhos no ensino infantil são diferentes dos pais de alunos do ensino médio.
Nesse momento nossas competências socioemocionais estão sendo colocadas à prova em todas as esferas da vida, e a escola não deixa de ser um catalisador dessas angústias, já que a educação dos filhos é tema central, ainda mais diante da falta de perspectiva para o retorno às aulas presenciais. Sendo assim, os gestores precisam redobrar os cuidados e incluir esse fator na estratégia de comunicação, para isso, entender o contexto de cada família é essencial. Deve ser levado em consideração também as dificuldades dos pais no acompanhamento dos filhos pequenos na hora de preparação das atividades a serem executadas pelos alunos das educação infantil e ensino fundamental, séries iniciais.
Apoiar os pais no desenvolvimento das atividades é central nessa “nova comunicação” e o apoio vai além do compartilhamento de técnicas pedagógicas. Atitudes simples para estimular e incentivar os pais nessa jornada são de grande valia, já que neste momento está com eles o papel de estimular os filhos a gravarem vídeos ou áudios curtos com dúvidas e enviar ao professor, ou ainda, fazer a ponte com outros pais e grupos de alunos para troca de experiências.
Hoje precisamos de um professor mediador e não de um mero expositor, e só o professor mediador exerce uma comunicação que pode impactar as relações e práticas educacionais. Comunicar com enfoque no envio e compartilhamento de informações é exercer o mesmo papel do professor expositor, aquele que apenas repassa o conteúdo. Do outro lado, o professor mediador está disposto a construir pontes, acolher e oferecer soluções, proporcionando espaços estimulantes para que alunos (e os pais) exerçam papel ativo no desenvolvimento da aprendizagem.
Apenas essa mediação pode sensibilizar os pais na continuidade do protagonismo mesmo após a normalização do cenário, é oportunidade única para que eles vivenciem de um jeito intenso os desafios dos processos comunicacionais. Essa relação poderá aproximar pais e filhos ao permitir mais conhecimento entre ambos sobre como cada indivíduo lida com o “aprender e ensinar”, reforçando a parceria escola-família.
Na crise educacional imposta pela pandemia mundial apenas as escolas, através de seus gestores e professores que aprenderem a comunicação mediadora poderão sair fortalecidas, sem grandes perdas sob o aspecto financeiro, porque conseguiram apoiar adequadamente seus alunos e seus pais neste momento. De nada adianta o investimento na melhor ferrramenta para ensino à distância se o principal, a comunicação mediadora com verdadeira inteligência socioemocional, não for implementada.
É hora de readaptar o sistema educacional, aliando tecnologia e inteligência emocional, metodologias diferenciadas, aulas interdisciplinares, suporte aos pais e alunos, comunicação mediadora. Ainda ficaremos um bom tempo sob os efeitos dessa pandemia e quanto mais cedo as escolas se reinventarem menores serão os prejuízos para todos. O que não podemos é aceitar o ano letivo de 2020 como perdido, somos todos, educadores, pais e alunos capazes de sairmos melhores dessa crise, com novas habilidades e competências, fortalecidos e seguros de nossa capacidade de superação.
Dynair Souza, Presidente da Comissão Processual Civil da Associação Brasileira dos Advogados em Cuiabá-MT, professora e advogada.
Link para a matéria no site olhardireto.com.br:
https://www.olhardireto.com.br/artigos/exibir.asp?id=12316&artigo=a-polemica-da-educacao-remota-nos-tempos-de-pandemia